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Nota de rodapé abandonada sobre a mesa

“Devo voltar a ocupar um lugar decente na sociedade. Perdoa-me, mulher, mas eu retorno, em breve, aos teus braços redondos. Há de me queimar as córneas a forte luz do abajur, hei de passar meus dias preso às histórias que me são indiferentes, junto aos livros que só querem bem perto o pó, repelentes aos humanos em suas ideias inconcebíveis. Oh, imaginação pútrida. Sei que é um erro, mas afasto-me de teus braços até achar o lugar, minúsculo que seja, onde hei de jazer como mais um conto torto na narrativa infinita da humanidade condenada ao abismo”

One Comment

  1. - wrote:

    “Trabalhas sem alegria para um mundo caduco,
    onde as formas e as ações não encerram nenhum exemplo.
    Praticas laboriosamente os gestos universais,
    sentes calor e frio, falta de dinheiro, fome e desejo sexual.

    Heróis enchem os parques da cidade em que te arrastas,
    e preconizam a virtude, a renúncia, o sangue-frio, a concepção.
    À noite, se neblina, abrem guarda-chuvas de bronze
    ou se recolhem aos volumes de sinistras bibliotecas.

    Amas a noite pelo poder de aniquilamento que encerra
    e sabes que, dormindo, os problemas te dispensam de morrer.
    Mas o terrível despertar prova a existência da Grande Máquina
    e te repõe, pequenino, em face de indecifráveis palmeiras.

    Caminhas entre mortos e com eles conversas
    sobre coisas do tempo futuro e negócios do espírito.
    A literatura estragou tuas melhores horas de amor.
    Ao telefone perdeste muito, muitíssimo tempo de semear.

    Coração orgulhoso, tens pressa de confessar tua derrota
    e adiar para outro século a felicidade coletiva.
    Aceitas a chuva, a guerra, o desemprego e a injusta distribuição
    porque não podes, sozinho, dinamitar a ilha de Manhattan.”

    Saturday, October 27, 2012 at 22:31 | Permalink