Queria virar mingau
sair no jornal
e afundar num extenso rio
como pedra
e lá ficar sempre
junto à corrente
como caracol,
olhando o sol,
rolando sem fim
até o mar
e de lá para o inferno
às ostras.
Queria tomar chá
de folha de crack
morrer de rir
com a deusa do sol e do amor
na beira do mar
tomando água gelada,
cerveja,
queria ser brotoeja
no seu calcanhar.
Queria matar
a dona do bar
tomar seu lugar
e te vender amor
na beira do mar
com um machado.
Um dia hei de ser rei
provar a ti
com sal
limão
e uma gota de cachaça
para tirar o gosto ruim do mar.
Tu deves ter gosto de gente
de sal, de rocha,
de flor. Por isso te amo.
Tu deves ter gosto de peixe
fritando na beira do mar
sob fina camada de farinha
numa enorme panela quente
cheia de óleo sujo
num farfalhar gostoso
de onda, serpente.
Areia nos olhos
coço e roço
perfuro
pálpebras gastas,
o gosto seco
do sal, do calor,
da gastura da areia
de um dia interminável na praia
pensando bobagens.
Tudo é bobagem,
minha cara,
pois vem de longe
uma agonia
um sonzinho besta
um ideiazinha idiota,
minha cara,
que diz:
“pula, pula no mar,
deixa a onda levar
tua alma
tua vida
teu corpo
vira areia
pedra, poeira,
mas deixa a onda te levar
que é melhor,
meu bem,
a vida na terra
é ruim, cheia de dor
horror, sujeira”